Para quem ainda não conhece, LOL é uma sigla para “Lil Outrageous Little”, em português, seria algo como “Pequenas Rebeldes”. A LOL é uma minúscula boneca que não passa de 8 centímetros, embalada por sete camadas de rótulos plásticos, os quais escondem surpresas, pistas de qual é a boneca escondida, acessórios, itens de vestuário e a própria identidade da personagem, que só é revelada após ser completamente aberta.
Criada pela MGA Entertainment e representada no Brasil pela Candide, as minibonecas chegaram ao país em maio de 2017 e viraram febre instantaneamente, sendo o sexto brinquedo mais pedido no Natal do mesmo ano, de acordo com a pesquisa divulgada pelo Google, que também afirmou que a busca pelas LOLs no Mercado Livre cresceu 44% entre novembro e dezembro do ano do lançamento. Quase não dá para acreditar que uma boneca com menos de 10 centímetros de altura possa fazer um sucesso tão grande!
E o sucesso não para. A cada temporada novos modelos são lançados, incluindo personagens, bonecas raras e séries especiais, atualmente ultrapassando 80 modelos diferentes. Não dá para negar que este é um ótimo convite para despertar o desejo pelas compras em série nas crianças desde cedo, muito menos que uma boa parcela do mercado se aproveita disso para aumentar as vendas.
Por falar em vendas, no Brasil, os modelos mais baratos de LOL variam de R$ 79 a R$120. Os kits maiores, com mais bonecas podem chegar até R$ 1 mil, como a LOL Big Surprise, e já são encontrados modelos raros sendo vendidos por R$ 5,5k na internet, acredite! A carga tributária brasileira é salgada para brinquedos e importados em geral, não é nenhuma novidade, mas mesmo no exterior não dá para dizer que as LOL são baratas. Enquanto as mais simples custam U$ 10, as mais caras chegam a U$ 70. Conclusão: muito dinheiro para pouco brinquedo.
Para quem entende mais sobre o valor do dinheiro, é impossível disfarçar a injúria. Depois de gastarem boas dezenas de reais, os pais se deparam com uma pequeniníssima boneca de plástico inerte, cujas funcionalidades são absorver e esguichar água como um brinquedo de banho, além de algumas mudanças na cor da roupa, em contato com a água. Fora isso, a boneca não faz nada além de se transformar em um item colecionável, algo que crianças pequenas dão pouco valor.
Então, você deve estar se perguntando o porquê de tamanho sucesso. Acontece que, para as crianças, o grande apelo da boneca é outro… A LOL Suprise virou um caso de amor com a criançada porque utiliza a surpresa como gatilho. Você não sabe qual LOL vai receber ao comprá-la. O principal atrativo da boneca é o ato de desembrulhar a embalagem e encontrar as novidades, que surgem a cada camada de plástico retirada. Elas foram especialmente projetados para a “geração YouTube”. O motivo delas terem conquistado tanto o público infantil não é segredo para ninguém. Trata-se de uma complexa estratégia de divulgação que se vale da influência de youtubers mirins e seus populares vídeos de unboxing.
Os vídeos de “unboxing” (desembrulhar, em português) são sucesso no YouTube desde que a plataforma existe. Pode-se dizer que é o ato de tirar um produto da caixa e compartilhar as reações e as primeiras impressões.
Mas o que faz disso algo tão importante capaz de mudar a percepção do consumidor sobre a marca ou o produto e impactar na decisão de compra? Do ponto de vista do marketing, a unboxing experience está totalmente ligada à fidelização de um cliente. Tratando-se de um e-commerce então, isso é ainda mais importante, afinal o momento de abrir o pacote, na maioria das vezes é o primeiro contato do cliente com o produto. Sendo assim, dá para dizer que a experiência de abrir o produto aliada a qualidade, prazo de entrega e um bom atendimento, garantem uma operação online.
O sucesso desse fenômeno não é por acaso, muito menos foi um acidente de percurso do marketing digital. A neurociência explica muito bem o porquê de ter dado tão certo. O neurobiólogo italiano Giacomo Rizzolatti foi quem descobriu os neurônios-espelho (Neuron Mirror), células responsáveis pelos comportamentos empáticos, sociais e imitativos. Estas células são ativadas quando um animal observa outro, normalmente da mesma espécie, e passa a fazer o mesmo ato. Eles são cruciais para a imitação. Basicamente, o neurônio imita o comportamento do outro animal como se estivesse ele próprio realizando tal ação. Os neurônios-espelho são as mesmas células que nos fazem bocejar quando vemos outra pessoa bocejando ou quando nos pegamos imitando um gesto de alguém próximo a nós de forma automática. De modo geral, sua missão é refletir a atividade que estamos observando e causar o desejo de repeti-las.
E foram os vídeos no YouTube que ajudaram a bonequinha viralizar. De 2015 para 2016, os canais com esse tipo de conteúdo alcançaram 52 bilhões de visualizações, de acordo com estudos da ESPM. A estratégia foi muito bem pensada já que, no Brasil, 50% dos maiores canais na plataforma são consumidos por crianças.
Para você ter uma ideia do tamanho do fenômeno, no topo do ranking da Forbes está Ryan ToysReview, o youtuber mais rico do mundo, com apenas 7 anos. Ryan movimenta mais de 22 milhões de dólares por ano e tem 19 milhões de inscritos em seu canal. Se eu disser que ele abre ovos-surpresa e caixas de brinquedos na grande maioria dos vídeos você irá se surpreender?!
O movimento unboaxing é tão expressivo que tem mudado o comportamento do consumidor final, mas também tem impactado diretamente a indústria que está adaptando as embalagens de brinquedos a esse novo jeito de vender. Enquanto antigamente os designers de embalagem trabalhavam para deixar os produtos mais visíveis nas prateleiras, hoje em dia quebram a cabeça para aumentar o mistério e aguçar o desejo de serem abertas.
Só o canal oficial LOL Surprise tem 332 milhões de visualizações. Os vídeos, inclusive, já ensinam as crianças a identificar as falsificações – ou como dizem os Youtubers mirins as “falsianes” – com vídeos que comparam, lado a lado, as embalagens sendo abertas e levantam cada ponto que diferem o produto falsificado do original.
Desde o início da febre, esse tipo de conteúdo inundou o YouTube, inclusive o YouTube Kids, plataforma exclusiva dedicada a crianças. Quando você menos espera, lá estão eles hipnotizados por outra criança abrindo presentes e alimentando a sua vontade de copiá-la. E para “ajudar” os youtubers não costumam abrir só uma, mas umas 10 bonecas LOL ao mesmo tempo para saber quais modelos receberam. Por isso não se espante se a sua filha pedir não apenas uma boneca, mas várias de uma vez. E se vier repetida, prepare-se para entrar em grupos de troca, que já se proliferam no Facebook.
As bonecas LOL parecem ser um ícone perfeito e muito bem pensado do consumismo voltado para crianças. Se são elas maiores, fazem pela coleção inesgotável. Se são menores, fazem apenas pelo prazer de abrir as embalagens. E é aí que começa o grande divisor de opiniões.
As LOLs e tantos outros brinquedos trazem consigo uma estratégia de consumo que já na década de 80 vinha sendo banida da publicidade desde que a Caloi usou dessa estratégia em uma campanha que incentivava as crianças a pedirem uma bicicleta de presente aos seus pais, tios e avós.
Os vídeos de unboxing voltados ao público infantil são uma estratégia semelhante que usa uma criança para provocar o desejo de consumo em outra sem a mediação de um adulto, o que é vetado pelo CONAR. Mas como esses vídeos são disseminados em perfis de youtubers mirins, o órgão não pode fazer nada a respeito. As crianças que assistem, com pouco ou nenhum discernimento do mecanismo de venda a qual estão sendo expostas ficam reféns e cabe somente aos pais decidir o que querem fazer a respeito da exposição dos seus filhos a esse tipo de conteúdo dentro de suas casas. O que você como consumidor, independentemente de ter filhos, pensa a respeito de tudo isso?